Perdida em Sodoma, 1982, Nilton Nascimento (Texto 2)
Inferninhos e infernões
Se alguém ainda duvida de que havia algum tema, algum assunto, algum acontecimento - seja cotidiano de qualquer página de jornal ou histórico - que não fosse interessar aos produtores e diretores da Boca do Lixo está muito enganado. E vem muito daí o fascínio que aquele polo de produção paulista das décadas de 1970 e 80 exerce até hoje. Afinal, onde já se viu um pedaço que agregasse tantos gêneros e subgêneros com os mais diferentes argumentos e roteiros? E, ainda, com diretores das mais diferentes linhagens e quilates? Por isso, nada de novo no front a Boca ter trazido para as telas sua visão de Sodoma e Gomorra. Aliás, até bastante coerente, não é? Mas não pense que a visão sobre as cidades amaldiçoadas e condenadas à destruição pela ira de Deus por causa de seus pecados se restringiu, pela lente da Boca, apenas as babeis bíblicas não. Aqui é a própria São Paulo e o Rio de Janeiro, com seus inferninhos e infernões, que reencarnaram a perdição incontrolável bíblica. Bom, estamos falando de Perdida em Sodoma (1983), de Nilton Nascimento.
Em Perdida em Sodoma Nicole Puzzi é Marlene, uma jovem do interior que chega a São Paulo em busca do pai rico que lhe manda mesada, mas não conhece; e da mãe que a abandonou ainda criancinha. Depois do encontro ríspido com o pai, Marlene perambulará pela noite de São Paulo e do Rio de Janeiro pelas mãos do cafetão Nassif em busca do paradeiro da mãe, veterana cantora da noite de canções italianas e prostituta. Daí, trafega por boates com shows de striptease e de sexo, casas de encontro e antros de prostituição. Tá aí a reencarnação dos pecados da Sodoma do título. O filme começa na própria Sodoma, com direito a Zilda Mayo de Pitonisa e tudo - e com cena de sexo explícito, aparentemente enxertada; outras acontecerão durante a trama. Depois desse prólogo, a trama se situa em São Paulo e, mais adiante, no Rio de Janeiro. Daí, a gente já fica imaginando o que motivou atores como José Lewgoy e, sobretudo, Juca de Oliveira, embarcarem nessa canoa. Ok, o explícito pode ter vindo depois, mas Juca, por exemplo, protagoniza cena pra lá de patética em uma boate, algo como um sub-sub-Rio Babilônia (1982), de Neville D´Almeida. O filme tem como principal destaque a façanha de ter reunido muitas musas da Boca – a protagonista Puzzi, pra variar lindíssima; mais Aldine Müller, Zilda Mayo, Sílvia Gless, Maristela Moreno, Tânia Gomide, Lia Furlin, Noelle Pinne, e ainda a carioca Alcione Mazzeo. Só que se transformou em mezzo pornochanchada mezzo pornô sem um décimo do talento dos verdadeiros realizadores do gênero. No caso aqui, dirigida pelo gaúcho radicado em solo paulista Nilton Nascimento, que foi de trajetória cinematográfica de interesse neo-realista até cair de boca no filão pornográfico como produtor dos filmes do filho, Carlos Nascimento, que assina a fotografia desse Perdida em Sodoma.
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