Alô?!, 1998, Mara Mourão
Jeitinho brasileiro
Não sei todos sabem, mas até a década de 1960 tínhamos menos de 10 diretoras de longa-metragem no Brasil. Com as conquistas sociais e sexuais dos anos 60 e 70, a situação foi se modificando e, a partir daí, outras mulheres conseguiram chegar ao formato. Agora o boom mesmo se deu com o chamado Cinema da Retomada, a partir de 1995, e que teve exatamente pelas mãos de uma mulher, Carla Camurati com Carlota Joaquina, seu marco definidor. Muitos nomes talentosos dos curtas migraram para o longa e nossa cinematografia foi enriquecida por gente de altíssimo quilate como Tata Amaral e Eliane Caffé. Hoje esse número acumulativo já soma mais de 250 cineastas pilotando longas dos mais diferentes gêneros. E dentre elas está a carioca radicada em São Paulo, Mara Mourão.
Em Alô?! (1998) acompanhamos uma turma de trambiqueiros do cotidiano: o casal formado pelo especulador imobiliário Herbert Richers Jr e sua esposa dona de butique Betty Lago; a empregada doméstica deles Myriam Muniz e o irmão dela e trapaceiro Wellington Nogueira. Richers Jr está às voltas com um negócio milionário de compra e revenda de terra. Lago copia os modelos de grifes famosas para vender na sua loja, enquanto sonega impostos e compra fiscais. Muniz arruma emprego no prédio para colegas e cobra delas comissão, expediente estendido para os feirantes, já que leva suas “meninas” para comprarem nas mãos deles. E Nogueira vende pedra em embalagem de videocassete, orégano por erva medicinal, afana cartões de créditos, e outros delitos do naipe. A comédia, que tem roteiro assinado por Mourão e Nogueira, casados na época – e não sei se ainda hoje -, imprime um ritmo esperto sobre o famoso jeitinho brasileiro, em que cada um quer passar a perna no outro – e daí tanto faz se é marido e esposa, irmão e irmã, mãe e filho, patrão e empregado, amiga e amigo. O filme marcou a volta ao cinema da saudosa Myriam Muniz, que estava há quinze anos afastada dos longas - seu trabalho lhe valeu o prêmio de Melhor Atriz no Festival de São Vicente; o filme foi o vencedor também de Melhor Direção no Festival de Cuiabá. Mara Mourão apresentou timing para a comédia nesse Alô?!, ainda que depois dele intercalasse filme do gênero como o rotineiro Avassaladoras (2002) com documentários premiados e saudados pela crítica, Doutores da alegria (2005) e Quem se importa (2012). Em Alô?! podemos matar saudades de Betty Lago, falecida precocemente aos 60 anos, e, sobretudo, conferir os talentos de Herbert Richers Jr e Wellington Nogueira, ótimos e impagáveis em seus personagens.
terça-feira, 19 de janeiro de 2016Longas Brasileiros assistidos em 2016 (018)
::Voltar
terça-feira, 19 de janeiro de 2016