Ano 20

15a Cineop - Mostra Contemporânea Longas

Cena de O filme da minha vida (2019), de Alvarina Souza Silva
A 15a Cineop - Mostra de Cinema de Ouro Preto exibiu, de 3 a 7 de setembro, sete longas em sua mostra contemporânea, e o Mulheres do Cinema Brasileiro conseguiu cobrir cinco: O filme da minha vida (2019), de Alvarina Souza Silva; Banquete Coutinho (2019), de Josafá Veloso; A jangada de Welles (2019), de Firmino Holanda e Petrus Cariry; Dorivando Saravá, o preto que virou mar (2019), de Henrique Dantas; Helen (2019), de André Meirelles Collazo - Cadê Edson? (2019), de Dácia Ibiapina foi assistido em janeiro na Mostra de Tiradentes; e José Aparecido de Oliveira - O maior mineiro do mundo, de Mário Lúcio Brandão e Gustavo Brandão, infelizmente, não deu tempo de cobrir (esperando já, ansiosamente, nova oportunidade).

Alvarina Souza Silva, cineasta de Goiás, tem uma trajetória extensa desde a década de 1980, quando estreou com o curta Alice na cidade maravilhosa, e também na área de produção, seara em que desempenhou vários funções em filmes de cineastas como Gilberto Loureiro, José Joffily, Walter Lima Jr, Sandra Werneck, Sérgio Bianchi e outros. Além disso, é roteirista de seus filmes.

Ainda assim, é uma cineasta um tanto invisibilizada, já que seus filmes são de difícil acesso. O Mulheres fez uma entrevista com ela, em que repassou sua carreira  - a entrevista pode ser consultada pela barra do menu superior:  Entrevistas/Depoimentos - Elas por Elas.

Alvarina trouxe para a 15a Cineop o documentário O filme da minha vida, em que revisita o filme de ficção homônimo que marcou sua estreia como diretora de longas em 1991. No primeiro filme, autobiográfico e protagonizado por Dira Paes, ela conta a sua trajetória no cinema, que começou como um sonho de infância até fugir de Goiás e ir para o Rio de Janeiro em busca de concretizá-lo. E, mais que isso, de viver sua vida, pois o cinema já despertou para si em estado de urgência.

No documentário de hoje podemos ver várias imagens da ficção de ontem, com cenas inteiras que marcam sua vida. Estão lá a sessão de cinema assistida com os pais e que lhe despertou o desejo; a relação amorosa e confidente com a irmã; a chegada ao Rio na casa dos produtores Luiz Carlos Barreto e Lucy Barreto, seu primeiro emprego em solo carioca. Estão lá também os bastidores das filmagens, já que eles fazem parte do todo.

A ficção O Filme da minha vida é a história filmada e os bastidores daquela verdadeira saga para colocar o filme de pé.  O filme é o sonho, mas é, sobretudo, sobre as dificuldades de ele virar realidade, tanto que começou a ser rodado , a maior parte, em 1990, e terminou em 91, pois teve que ser interrompido várias vezes.

O documentário O Filme da minha vida é um reencontro da cineasta, agora muito mais experiente, mas ainda assim sempre na luta para realizar seus filmes, que, impressionantemente, são muitos - como conta na entrevista. É interessante acompanhar, por meio dele, as primeiras imagens, ver Dira Paes ainda na primeira fase da carreira, a sempre marcante e ótima Sandra Barsotti como sua mãe, Ivan de Almeida como seu pai, e outros atores, como o saudoso Guilherme Karan interpretando o Barretão. E é interessante também acompanhar o olhar de Alvarina sobre aquelas imagens e sobre si mesma, passados quase 30 anos.

A narração que ela faz nunca se eleva em tons, ainda que seja possível sentir sua "tristeza", ou, pelo menos, como ela pode ter se sentido,  quando de algumas críticas negativas, ainda que também teve positivas, que apontaram o amadorismo como quando O filme da minha vida  foi lançado no Festival de Gramado. Como está contado no próprio filme, ele foi feito com sobra de negativos e até teve que enxertar cenas. Ou mesmo quando narra a sua história, aquele sonho de infância e a realidade que teve que enfrentar. Ou ainda ao analisar sua inexperiência quando da realização do longa.

O documentário vai alinhando as imagens do primeiro filme, algumas cenas atuais, em belo p&b, e a narração da cineasta. Com isso, acompanhamos uma transversal do tempo, em que o passado e o presente se encontram a partir não só da focalizada, mas também como um retrato, ainda que nas estrelinhas, do que sonhamos e do que podemos fazer com esse sonho, da tecitura do sonho e das arestas do real.

Assistir ao documentário O Filme da minha vida, mais que tudo, nos faz ter vontade de assistir a ficção de 1990/91, e já aí está o grande mérito dessa nova obra da cineasta. Pois ainda que Alvarina Souza Silva esteja em várias fichas técnicas de filmes importantes desde meados dos anos 1980 para cá, ou seja, já há três décadas e meia, e, portanto, conseguiu colocar em prática o projeto acalentado em sonho, está mais do que na hora de conhecermos seus filmes como cineasta e tirar esse véu de invisibilidade que parece cobrir sua obra.

Se até a década de 1960 temos menos de 10 mulheres dirigindo longas-metragens no cinema brasileiro, foram as décadas de 1970,1980 e 1990 que reafirmaram essa presença fundamental atrás da câmera em tantos filmes que foram chegando, ou não, às telas, e elevando ainda mais o patamar do cinematografia brasileira. Alvarina Souza Silva é uma dessas mulheres, e, realmente, precisa ser mais conhecida, mais vista, e mais comentada. Aliás, já passou da hora.


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15a. Cineop - Mostra de Cinema de Ouro Preto
De 3 a 7 de setembro - Programação gratuita
www.cineop.com.br

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Sala 
 Betty Faria
Com amor profundo pelo cinema, premiada em vários festivais no Brasil e no exterior